PGFN dispensa procuradores de recorrer em processos sobre ganho de capital

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) publicou, no Diário Oficial da União desta quarta-feira (27/06), os Atos Declaratórios nº 11 e 12/2018. As normas dispensam os procuradores do órgão de apresentarem recursos em casos relacionados à tributação de ganho de capital e salário-educação.

A possibilidade de edição desse tipo de norma consta na Lei nº 10.522/2002, que permite a desistência quando há jurisprudência pacífica nos tribunais superiores. Os atos também autorizam os procuradores a desistirem da interposição de recursos já apresentados, “desde que inexista outro fundamento
relevante”.

O Ato nº 11 autoriza a não interposição de recursos em casos “que visem obter a declaração de não incidência da contribuição social do salário-educação sobre a remuneração paga aos trabalhadores avulsos, a partir da vigência da Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996.”

Já o Ato Declaratório nº 12 permite a desistência “nas ações judiciais que fixam o entendimento de que há isenção do imposto de renda no ganho de capital decorrente da alienação de participações societárias adquiridas até 31/12/1983 e mantidas por, pelo menos, cinco anos, sem mudança de titularidade, até a data da vigência da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988″.

No texto dos atos estão listados mais de 10 decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que afastaram a tributação em ambas as situações. A jurisprudência mais recente relativa à isenção do IRPF é de abril deste ano, enquanto o Recurso Especial mais recente em relação ao salário-educação é de 2016.

Divergência no Carf

A posição da PGFN no Ato Declaratório nº 11 influenciará o debate sobre a tributação do ganho de capital em ações adquiridas antes de 1983 e alienadas posteriormente.

De acordo com o Decreto-lei nº 1.510/1976, as ações adquiridas nesse período e mantidas em posse por pelo menos cinco anos seriam isentas do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), mesmo se a alienação ocorresse em momento posterior. O dispositivo perdeu efeitos em 31 de dezembro de 1988.

No Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), os processos que debatem a tributação objeto dos Atos nº 11 e 12 ficam a cargo da 2ª Seção de Julgamento.

O resultado nem sempre é uniforme: um levantamento feito pelo JOTA na base de dados de acórdãos do Conselho apontou ao menos 18 casos sobre o tema com ementa publicada no último ano. Entre os acórdãos, os conselheiros deram ganho de causa à Fazenda Nacional em cinco deles. Sete casos foram decididos em favor dos contribuintes. Existem ainda seis decisões pelo parcial provimento – em sua maioria, extinção da multa qualificada, de 150% do imposto devido, e manutenção da chamada multa de ofício, no valor de 75%. Os processos sobre o tema têm contado, até sessões mais recentes, com sustentações orais por parte da Procuradoria.
Em abril, por exemplo, uma decisão da 2ª Turma da 2ª Câmara da 2ª Seção manteve a incidência do IRPF, por voto de qualidade, sob a argumentação de que não havia previsão sobre o tempo que a isenção da 1.510/1976 deveria valer. “Não vejo no trecho do Decreto-­lei qualquer dispositivo que diga por quanto tempo essa isenção se estenderá”, afirmou a relatora do caso, Rosy Adriane da Silva Dias, em seu voto.

“O que diz o Decreto-lei é que as quotas tinham que ficar em poder dos sócios por 5 anos, para que tivessem direito à isenção, mas não diz, por exemplo, que a isenção albergada em função desse dispositivo vigorará por 5, 10 ou 20 anos, assim, não havia um tempo estimado para que a pessoa física gozasse dela”, concluiu a conselheira.

Nos meses de maio e junho, por outro lado, a 2ª Turma da 4ª Câmara da 2ª Seção analisou um lote de quatro processos com a temática. O colegiado decidiu, também por sete votos a um, por anular parte de decisão tomada pela Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ), órgão imediatamente inferior ao Carf, por haver concomitância da discussão administrativa com uma decisão judicial. Nesse lote de processos, a turma devolveu os autos para a DRJ, para que esta se manifestasse sobre os assuntos restantes, que não teriam sido apreciados pela Delegacia.

Na maioria dos casos, no entanto, a turma deu provimento ao recurso movido pelo contribuinte. Em um processo julgado pela 1ª Turma da 2ª Câmara da 2ª Seção em maio, o recurso ao contribuinte foi provido por maioria de votos.

“Por mais que o STJ tenha entendido que se trata de direito adquirido e entendido em sua interpretação que o contribuinte tem direito à isenção apenas às ações adquiridas até o ano de 1983”, argumentou o relator do caso, conselheiro Marcelo Milton da Silva Risso, em seu voto. “Com a devida vênia, entendo que pela interpretação do art. 4º do DL.1510/76 que o contribuinte faz jus às ações recebidas através de ações bonificadas”, defendeu o julgador.

A conclusão encontrou resistência entre membros do colegiado. “Não se pode perder de vista que este caráter perpétuo atribuído a tal isenção, no meu sentir resultante de uma interpretação equivocada dos fatos e da legislação, evidencia entendimento absolutamente contrário ao ordenamento jurídico em vigor”, afirmou o conselheiro Carlos Alberto do Amaral Azeredo em declaração de voto.

Não foram encontrados registros sobre a não incidência do salário-educação na contratação de funcionários avulsos, tema do Ato nº 11, na base de dados do Carf relativo aos últimos 12 meses.

Ato nº 12 é tema pacificado no STJ

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), por outro lado, as duas turmas que analisam direito público já julgaram o tema de tributação sobre ações antigas, com entendimento contrário ao da PGFN. Dentre os casos citados pela PGFN como jurisprudência no ato nº 12, o mais recente é o Recurso Especial (REsp) nº 1.659.265, analisado em 19 de abril pela 2ª Turma, com relatoria do ministro Og Fernandes.

Para o magistrado, já havia entendimento, em outros processos analisados pelo STJ, pela declaração da isenção do IRPF nas operações deste modelo. “Quanto ao mérito da controvérsia”, iniciou o ministro, “tem-se que a jurisprudência deste Tribunal Superior firmou-se no sentido de que ‘a isenção concedida pelo art. 4º, “d”, do Decreto-Lei n. 1.510/1976, pode ser aplicada a alienações ocorridas após a sua revogação pela Lei n. 7.713/1988, desde que já implementada a condição da isenção’”.

No REsp, os ministros Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães, Herman Benjamin e o presidente Francisco Falcão divergiram do relator.

 

Autor: Guilherme Mendes, Jota.
Fonte: https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/pgfn-ato-declaratorio-dois-temas-29062018